O Escritor

EÇA DE QUEIROZ E O BRASIL

Eça de Queiroz nunca foi ao Brasil, mas, de uma ou outra forma, a sua vida sempre esteve ligada a este país. Desde a sua Ama brasileira nos primeiros anos da sua vida, até às colaborações com a Gazeta de Notícias e a Revista Moderna, passando pelos amigos brasileiros que encontrou em Londres e Paris, tudo contribuiu para que, mesmo que não física, se criasse uma ligação indelével entre Eça, a sua obra e o Brasil.

A sua primeira ligação ao Brasil foi efectivamente a sua ama, Ana Joaquina Leal de Barros, pernambucana. Mas, na realidade, os laços com o Brasil já se podem encontrar antes do seu nascimento. O seu avô, Dr. José Joaquim de Queiroz e Almeida, refugiara-se no Rio de Janeiro, na época das lutas liberais. Ali nasceu José Maria de Almeida Teixeira de Queiroz, pai do romancista, em 1820, dois anos antes da Independência Brasileira. Regressada a Portugal, a família Queiroz trouxe um casal de criados pretos, Rosa e Mateus. Foram estes que, mais tarde, acarinharam o pequeno José Maria Eça de Queiroz, lhe cantaram cantigas de embalar e contaram histórias misteriosas do Sertão.

Domício da Gama, em Londres, ou Eduardo Prado e Olavo Bilac, em Paris, são apenas três dos muitos conhecimentos e amizades brasileiras que granjeou ao longo da vida. A sua convivência com estes foi todavia mais estreita, tendo privado largas horas, em conjunto com a mulher e os filhos, junto destes seus “grandes e inesquecíveis” amigos. Mas as ligações de Eça com o Brasil passam em grande medida pela sua obra literária e a sua influência naquele país. Quando começou a sua carreira consular, Eça de Queiroz concorreu para um cargo consular na Baía, tendo, porém, sido colocado em Havana. O seu primeiro contacto literário com o Brasil terá sido, em grande medida, resultante da sua participação nas Conferências do Casino e no protesto que assinou contra a decisão do governo de proibir aqueles eventos. Eça esperou a colocação diplomática durante um ano, tendo então fundado, com Ramalho Ortigão, o periódico As Farpas. Em Fevereiro de 1872, um texto daquele folheto, ridicularizando o imperador D. Pedro II por ocasião da sua visita a Portugal em 1871, foi reproduzido clandestinamente no Brasil, e aproveitado pela propaganda republicana. Mas se estas páginas chocavam apenas os monárquicos, as páginas da crónica «O Brasileiro», também aparecida n’ As Farpas, chocaram quase todos, com as suas palavras jocosas, a caracterizar o brasileiro como tipo humano risível.

Teriam de passar seis anos para que o sucesso literário de Eça no Brasil se começasse a afirmar. Com a edição d’O Primo Basílio, em 1878, vem uma forte crítica de Machado de Assis, que critica igualmente O Crime do Padre Amaro. Associado ao romantismo, Machado de Assis não aprecia as liberdades do realismo. Mas se estas críticas são fortes, a verdade é que dão azo a artigos em defesa de Eça, tudo isto contribuindo para uma rápida divulgação do trabalho do escritor no Brasil. É a partir de 1880 que Eça de Queiroz inicia uma importante colaboração — 16 anos — com a Gazeta de Notícias, do Rio de Janeiro. É neste periódico que são publicadas A Relíquia e Cartas de Fradique Mendes, bem como todas as crónicas depois reunidas em livro, com os títulos Cartas de Inglaterra, Ecos de Paris, Cartas Familiares e Bilhetes de Paris.

Com a sua transferência para Paris, Eça passa a sentir ainda mais o Brasil. A sua casa torna-se palco de visitas assíduas de intelectuais e diplomatas brasileiros como os já referidos Domício da Gama, Eduardo Prado e Olavo Bilac, mas também Paulo Prado, Magalhães de Azeredo e o barão de Rio Branco.

A sua morte foi extensamente falada e chorada no Brasil, tendo mesmo tido a honra de um monumento na cidade do Rio de Janeiro.

Bibliografia:
LYRA, HEITOR (1965) ‘O Brasil na vida de Eça de Queiroz’, Ed. Livros do Brasil, Lisboa
MATOS,A.C. (1988) ‘Diccionário de Eça de Queiroz’, Ed. Caminho, Lisboa